O avanço tecnológico tem provocado profundas mudanças no mundo, inclusive na economia.
Um estudo da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom) mostrou que, só no ano passado, no Brasil, o setor de tecnologia da informação e comunicação (TIC) cresceu 9,3%[1]. De acordo com o mesmo levantamento, a produção deste setor chegou a R$ 653,7 bilhões, representando 6,6% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional[2], com perspectivas de crescimento para os anos seguintes.
Certamente essa relevância econômica das tecnologias da informação e comunicação deve ser reconhecida, dentre outros, pelo próprio Direito, que deve se colocar de modo a atender os anseios sociais de um mundo digital em expansão.
Esta também parece ter sido a conclusão do Tribunal Superior do Trabalho que, por entender “absolutamente desproporcional” e “quiçá irreversível”, determinou a suspensão de realização de prova pericial em algoritmo do aplicativo da 99 Taxis.
No processo em questão (autos nº 11772-82.2022.5.03.0000), discutia-se decisão judicial que, em reclamação trabalhista, deferiu a realização de perícia técnica no algoritmo do aplicativo da 99 Taxis Desenvolvimento de Softwares Ltda para identificar “as condições em que se dava a distribuição das chamadas, a definição de valores a serem cobrados e a serem repassados, a existência de restrições ou preferências no acesso e na distribuição de chamados em decorrência da avaliação e da aceitação ou frequência de realização de corridas, bem como o conteúdo das comunicações entre a ré o motoristas”[3].
A intenção do trabalhador, que atuava como motorista de aplicativo, era que a perícia pudesse auxiliar no pedido para reconhecendo de vínculo de emprego com a empresa de tecnologia a partir das regras de distribuição e pagamento de corridas definidas no algoritmo.
Ao apreciar o caso, o Tribunal Superior do Trabalho destacou a importância que informações (como algoritmos de aplicativos) têm para a perenidade dos negócios digitais, sendo imprescindível sua proteção, de modo a não comprometer a própria existência de tais empresas.
Nas palavras do Ministro Relator Luiz José Dezena da Silva:
(…) Não é crível que empresas de tecnologia, como da espécie, devam expor e revelar informações secretas que possam comprometer a competitividade no mercado em que atuam.
De fato, a perícia técnica nos algoritmos da empresa torna vulnerável a propriedade intelectual e industrial no que toca aos pontos de atuação e à identificação das correlações de dados de inteligência utilizados pela empresa…[4]
A decisão da Corte Trabalhista destaca, assim, a imprescindibilidade de proteção da propriedade intelectual e industrial das empresas, sobretudo em uma realidade cada vez mais digital, a qual não pode ser violada (de modo desproporcional) ainda que em processos judiciais, onde o juiz tem a liberdade para determinar os meios de prova necessários ao seu convencimento.
Nesta conjuntura, também parece ser importante anotar a relevância de uma efetiva governança em segurança da informação pelas empresas, com a adoção de medidas, técnicas, jurídicas e administrativas, aptas a proteger seus ativos intelectuais e não comprometer a sustentabilidade do negócio.
Referências
[1] VASCONCELOS, Eduardo. Puxada por telecom e TI nas empresas, indústria de TIC cresce 9,3% em 2022. Disponível em: https://www.telesintese.com.br/puxada-por-telecom-e-ti-nas-empresas-industria-de-tic-cresce-93-em-2022/. Acesso em: 01 nov. 2023.
[2] Ibidem.
[3] TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Acórdão em Recurso Ordinário em Mandado de Segurança TST-ROT-11772-82.2022.5.03.0000. Julgado em 24.10.2023.
[4] Ibidem.
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Sobre o autor
Rafael Sgoda Tomazeti – Advogado, sócio da Moreno Moro Advogados. Mestrando em Direito das Relações Sociais pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Graduado em Direito pelo UniBrasil – Centro Universitário Autônomo do Brasil (antiga FACBRASIL – Faculdades Integradas do Brasil), tendo sido laureado com o título de melhor aluno do Curso de Direito (2017.2). Especialista em Compliance e Integridade Corporativa pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) e em Direito Empresarial pela Faculdade Legale. Membro relator da Comissão de Estudos sobre Compliance e Anticorrupção Empresarial e da Comissão de Direito Digital e Proteção de Dados, ambas da OAB Paraná. Possui certificação profissional LGPDF™ (Fundamentos na Lei Geral de Proteção de Dados) conferida pela CertiProf, LLC. Possui formação em propriedade intelectual pela World Intellectual Property Organization (WIPO) e em proteção de dados pelo Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS Rio).